quarta-feira, 27 de abril de 2011



Encontro marcado para o pequeno almoço

O DESTINO FICA A 30 KM DE LUANDA

[Texto e Fotos: Alexandre Correia]

Os mais fatalistas dizem que não há como fugir dele e os místicos asseguram que o caminho está traçado. Os aventureiros nem se preocupam com isso, enquanto que os românticos preferem marcar encontro com ele. Com o destino, porque é disso que estamos a falar. Tal como as mulheres que Martinho da Vila canta, também há todo o tipo de destinos. Uns mais directos, outros sinuosos; para se alcançar uns tomam-se atalhos, ou por vezes escolhemos o caminho mais longo, mas o certo é que sempre, na vida, chegamos a um destino.
Na manhã em que saí de Luanda para dar início ao 5º Raid T.T. Kwanza Sul, tinha encontro marcado com o destino! E devo dizer que poucas vezes senti tanta vontade de chegar, quanto antes, ao destino. Acordado a meio da noite, saí para a rua ainda era escuro e deixei a capital angolana quando estava a amanhecer. Teria preferido levantar um pouco mais tarde e não sair sem antes ter tomado o pequeno almoço. Para mais, seria um excelente pequeno almoço, pois encontrava-me instalado no Hotel Trópico, que hoje é referência pela mesa farta, esquecidos que estão os tempos em que até num dos melhores hoteis de Luanda a comida era racionada. Porém, os organizadores desta viagem anual por terras de Angola sempre “castigaram” os expedicionários com uma partida discreta, o mais tardar ao nascer do dia, e sempre em jejum. O trânsito de Luanda e fugir dele antes das horas de maior fluxo, são a preocupação dos responsáveis pelo raide, justificando por isso o sacrifício que é imposto aos que tomam parte da caravana, que mercê disso, na manhã em que a aventura começa, já sabem que vão partir em jejum e que tardará umas horas — nunca ninguém sabe exactamente quantas… … até que possam matar a fome.
Na quarta edição, conduzimos até à barra do Dande, mais a norte da capital, até podermos tomar o pequeno almoço, que não estava sequer preparado e tardou em ser servido, pondo imensa pressão nos organizadores e participantes, pois havia longos quilómetros para cumprir. Desta feita, a distância para vencer logo na primeira jornada era igualmente longa ¬— desde Luanda até Calandula, a vila nas imediações da quedas da água que outrora eram conhecidas por Quedas Duque de Bragança. Uma vez mais, também não havia tempo a perder. Nem para o pequeno almoço, até porque não havia como fugir dele, pois neste caso concreto mais do que qualquer outra coisa, havia um compromisso a respeitar: os responsáveis por um resort turístico recentemente inaugurado em Kikuxi, no concelho de Viana, tinham proposto oferecer o pequeno almoço aos cerca de seis dezenas de expedicionários, a troco, claro, de uma visita às instalações deste complexo hoteleiro, perdido no meio de planícies salpicadas por embondeiros, onde se chega percorrendo um caminho de terra, poeirento e esburacado. Esse resort é a Quinta do Destino.
Uma placa de madeira, afixada junto ao portão, também em madeira, dá aos boas vindas à Quinta do Destino. Entrando, o mato dá lugar a relva viçosa, num amplo jardim que se estende por cinco hectares cheio de árvores com copas generosas, para proporcionarem boas sombras. No meio desta propriedade vedada por uma rede metálica, que deixa bem vincada que este não é um destino para qualquer um, erguem-se 42 bungalows, pintados num tom rosa que se destaca no meio de tanto verde. Ao centro, fica o salão de refeições, onde toda a equipa nos recebeu com mesas recheadas, que rapidamente se esvaziaram. A máquina de café expresso, essa está instalada ao lado, no bar da enorme piscina, rodeada por espreguiçadeiras e chapéus de sol, num convite quase irresistível a não fazer nada e aceitar a preguiça como destino. Infelizmente, as pastilhas de café não chegaram para contentar todos os candidatos a uma chávena de expresso. Apenas para os primeiros que esticaram o dedo e pediram. Quando a equipa da Quinta do Destino se reuniu para uma foto de família, junto com os expedicionários, restávamos apenas nós. Os atrasados, para quem café é café. Não tem de ser expresso, mas apenas bom café puro. E esse, abundava em termos que poucos abriram.
Senti alguma desilusão no rosto dos nossos anfitriões, uma equipa jovem, que se fardou para uma manhã que imaginava especial, mas que afinal mal viu a cara daqueles que convidou. Mas os sorrisos logo se rasgaram quando pedi que se juntassem todos para registar aquele momento numa fotografia. E prometi que não só a enviava, como a divulgaria. A promessa tardou, mas agora está cumprida. Mais do que o pequeno almoço, o que gostei mesmo foi daqueles sorrisos. E também teria gostado de ficar a torrar um pouco ao sol e depois arrefecer na piscina, enquanto iam buscar mais pastilhas para me oferecerem um café expresso. Mas o destino continua a chamar por mim. E empurrava-me de volta à estrada, para mais uma viagem memorável, a conhecer novos lugares de Angola, combinando o enorme prazer da descoberta com o prazer de rever outros lugares, que já antes tinham ficado gravados na memória.

Sorrisos rasgados, a equipa da Quinta do Destino recebeu a caravana do 5º Raid T.T. Kwanza Sul de braços abertos e mesa recheada. Quando partimos, tinham motivos para se sentir contentes.

Os bungalows da Quinta do Destino, pintados em rosa forte, para contrastar com o verde intenso dos cinco hectares de jardim.



Naquela manhã, não foi o destino que nos levou até à Quinta do Destino. Foi o arranque do 5º Raid T.T. Kwanza Sul, que prosseguiu rumo a Calandula por caminhos nunca antes percorridos por esta caravana.