quarta-feira, 19 de agosto de 2009


Porque hoje é Dia Mundial da Fotografia
RETRATO DE QUINZE SORRISOS ANGOLANOS

[Texto e Fotos: Alexandre Correia]

Cada dia do ano é dia de qualquer coisa. Ao 19 de Agosto calha ser o Dia Mundial da Fotografia, celebrando internacionalmente uma das coisas que os últimos anos mais vulgarizaram e popularizaram, desde que a fotografia digital se banalizou. Longe vão os tempos em que as fotos eram a preto e branco, gravadas numa placa de vidro. Depois passou a ser uma película que, por sua vez, somente se coloriu nos idos anos 60 do século passado, embora tivesse, pelos custos, demorado cerca de duas décadas a conquistar o público. Hoje, já nem sequer é preciso ter uma câmara para registar fotografias; a generalidade dos telefones celulares já incorpora a função de máquina fotográfica e os modelos mais sofisticados conseguem até assegurar uma qualidade impressionante. E com a fotografia digital, não só chegaram as fotos instantâneas, que estão prontas a ser apreciadas assim que disparamos, como nasceram os fotógrafos instantâneos, que são capazes de tudo, nomeadamente de copiar as imagens que os encantaram e que, normalmente à custa de sucessivas tentativas, conseguem às vezes exibir belas fotografias, daquelas que fazem disparar a vaidade ao seu autor e a inveja aos que as contemplam. Mas, tal como não é o acto de escrever que faz de alguém um escritor, também não é por se tirar fotografias que nos tornamos fotógrafos. Até podemos viver disso, apresentando-nos, com toda a legitimidade, como "profissionais", mas é preciso recordar que a única diferença entre um profissional e um amador é, precisamente, que o primeiro faz dessa actividade o seu modo de vida, enquanto que o segundo a desempenha meramente por prazer. Há bons e maus profissionais em todas as áreas, como em muitas há igualmente amadores cheios de talento e competência, que davam excelentes profissionais se quisessem apostar nisso para viver. Na fotografia, o retrato de pessoas sempre foi uma das áreas importantes. Antigamente, ia-se ao fotógrafo registar um retrato que imortalizasse uma ocasião especial, como um aniversário ou um nascimento, mas já para um baptizado ou casamento era hábito contratar-se o fotógrafo. Agora, mesmo quando se contrata um fotógrafo, toda a gente fotografa por tudo e por nada. E toda a gente faz retratos a toda a gente. Sobretudo a gente que não conhece de lado nenhum. Nunca o fiz, mas senti bem nada pele o incómodo disso quando, em 1998, fui a estrela de uma sessão fotográfica de um grupo de turistas asiáticos, com quem me cruzei nos átrios do enorme Centro Cultural de Belém, a dois passos do meu escritório em Lisboa. Não os obriguei a apagar as fotografias, nem sequer me zanguei com eles. Mas tive uma oportunidade rara de sentir quanto invasivo é fotografarem-nos sem que o desejemos. Alguns fotógrafos dizem que assim conseguem obter retratos muito espontâneos e naturais; concordo que sim, mas isso não me me permite aceitar fazê-lo. Até porque a experiência diz-me que os retratos são muito mais autênticos e reveladores quando previamente acordados. As quinze imagens que aqui deixo, retratam várias gerações de mulheres angolanas, desde algumas que já há muito serão avós, pela certa, até outras que ainda só são as suas netas. Em comum, todas estas fotografias têm dois aspectos: foram feitas a pedido das próprias e captaram sorrisos. Uns mais rasgados, outros mais tímidos, mas todos eles genuínos. E há ainda outro ponto em comum, o olhar a descoberto, sem óculos escuros para esconder o que lhes vai na alma. Nem todos os olhares são alegres...













14 comentários:

  1. Lidas fotos, sempre. Eu nao sabia que hoje era dia da fotografia. Realmente, são muitos dias pra comemorar... dia do amigo, do fotografo, da fotografia, das maes, dos pais, dos avós, dos avôs, dos amantes, dos namorados, natal, ano novo, pascoa, independencia disto e daquilo, e por aí afora.

    Ainda assim valeu a idéia dos retratos. Fiquei também imaginando voce no centro das atencoes fotográficas. Eu nao sei voce, mas eu geralmente odeio aparecer em fotografias. Ultimamente estou até menos rebelde, mas em geral eu fugo do lado da frente da camera. As vezes eu desconfio que eu virei fotógrafa só pra ter a desculpa de não poder ir pra frente da máquina, hehehe

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  2. Olá Alexandre!

    Também não sou capaz de fotografar o retrato de uma pessoa sem a sua autorização, pela invasão, pelo incómodo que poderia provocar. Claro que houve momentos em que o dedo esteve no seu limite para pressionar o botão e tirar a foto àquela indígena de tranças e pele escurecida pelo sol, de vestimentas artesanais tão belas e coloridas, de olhar cansado mas esperançado (que alguém comprasse os seus artefactos), mas não consegui… Há olhares, expressões, momentos que ficam na memória, sem a necessidade de serem materializados se disso depender a invasão do “eu” de alguém.

    Olhares e expressões incrivelmente fortes... As quinze fotos que nos presenteia captam expressões únicas, e cada uma delas dava para escrever uma história.

    Abraço,
    Silvia

    PS. Li hoje o seu comentário à minha viagem no Chepe. Foi uma experiência realmente maravilhosa e aquele mergulho no Pacífico (depois de alguns meses sem ver o mar) foi inesquecível! Mas imagino que depois de 12 dias sem tomar banho, mais apetecível seria esse mergulho!

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  3. Parabéns ao fotógrafo!!! Fotos de uma beleza fantástica. Nao me arrependo da indicacao para o Blog de Ouro. Há ARTE neste blogue.
    Obrigado pela partilha.
    Namibiano

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  4. Olá Gui!

    Durante muitos, muitos anos, nunca fazia uma foto minha, fosse onde fosse. Continuo a não me sentir muito bem com isso, mas às vezes sinto que preciso de ter "essa" foto para eu próprio não achar mais tarde que foi só imaginação. Vou-lhe contar uma coisa, divertida e triste ao mesmo tempo: há uns tempos, durante um jantar de confraternização a meio de uma sessão de trabalho, para quebrar o silêncio e ouvir algo mais que as moscas a zumbir, fiz conversa sobre as minhas viagens e a mesa tornou-se na mais animada. O incrível é que a dada altura ausentei-me por uns momentos e mais tarde um colega amigo confidenciou-me que outro, aproveitando a minha retirada, tinha comentado que eu tenho histórias muito divertidas, mas é tudo imaginação, porque sou muito mentiroso. Bem, lá diziam os romanos muito sabiamente que Omo omnis mentax (em latim: todo o homem é mentiroso), mas cada vez evito não passar da mentirinha piedosa, que quando muito só nos leva ao agradável "inferno africano", e nunca inventei nada sobre episódios que me aconteceram em viagem. Bem pelo contrário, há tantos que eu próprio só acredito porque quem testemunhou me recorda e confirma que foi mesmo verdade. daí que, por vezes, é preciso ter uma prova. Nem que seja para afastar esses maus espíritos, que merecem um "inferno americano" reforçado com "aquela" comida do africano em triplicado!

    Um beijo,

    Alex

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  5. Olá Silvia!


    Como diz, cada uma das quinze fotos dava para contar uma história, até porque falei o suficiente com as protagonistas para conseguir contar uma história. E acredite que doze dias sem tomar banho é penoso, mas infernais foram só os três primeiros dias e o último, quando embarquei num Boeing 737 para Santiago do Chile (com mais 17 que iam como eu...) e ia havendo uma revolução a bordo, que acabou por uma nova arrumação dos passageiros, passando para as últimas filas os que não tomavam banho, por forma a deixar algumas de intervalo para os "limpinhos". Ao chegar a Santiago, a segurança não nos deixou entrar no nosso hotel, um dos mais luxuosos 5 estrelas da capital chilena e foi um problema que aceitassem receber-nos, apesar do alojamento ter sido previamente pago. Meia hora e um sabonete enorme depois, parecia que tinha perdido imenso peso e ganho anos de vida. Depois, desci ao salão do bar e embora sentisse que tresandava a perfume de rosas daquele que antigamente se vendia ao litro nas drogarias (se calhar isso já não é do seu tempo...), tanto sabonete que gastei, sentia-me também muito bem, por ter terminado uma viagem tão inesquecível quanto infernal, em que sofri imenso. Pedi um gin tónico, mandei servir uma bebida ao pianista e pedi-lhe se tocava só para mim. Escolhi "As time goes by" e...

    Um Beijo,

    Alex

    PS - Que estas imagens inspirem muita coisa, como os poemas do amigo Namibiano. Porque não?...

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  6. Olá Alexandre... ao ver estes sorrisos, ao ler estas palavras, ao ver as imagens que colocas... só me ocorre a célebre frase já nossa conhecida..."Óh gente da minha Terra...". O que de maravilhoso ali existe... Chegar ao final da tarde ou mesmo perder a manhã a enviar o teu blog a amigos de varias gerações que já lá não vão a anos e sentir na sua voz a alegria nostálgica, o derrame de uma lágrima de quem desperta memórias outrora guardadas é de facto extraordinario…
    Agradeço-te por esse pedacinho de céu....
    Beijo

    Márcia Gigante

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  7. Olá Márcia,

    É um prazer ter leitores assim neste blog tão especial e tão diferente da generalidade dos blogs. Aqui, o objectivo é contar histórias de viagens de modo a permitir que os leitores consigam viajar através delas e das suas memórias e imaginação. As fotos são apenas um "amouse bouche", para entreter e estimular essa imaginação.
    Obrigado por contribuires para a divulgação deste blog. Espero contar contigo como seguidora e, sobretudo, leitora fiel. Até porque as minhas viagens não são só por Angola...

    Um beijo,

    Alexandre Correia

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  8. Ainda bem que colocaste aqui estas fotos maravilhosas, destes sorrisos lindos e limpidos, assim muita gente pode usufruir deste teu trabalho e não acredito que haja alguém que não goste de ver esta preciosidade, que eu já conhecia na maioria e que guardei com carinho na minha pasta "angola"

    obrigada Alexandre

    Um abraço carinhoso

    Lena

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  9. Olá Lena,

    Estas imagens e todas estas histórias estão guardadas na minha memória. E o blog é como se fosse o abrir da minha memória a todos os que querem conhecer tudo isto e enriquecer as suas próprias memórias, seja nas suas cabeças ou nos seus computadores. Escolhi sorrisos e expressões felizes, porque de gente triste e mal encarada já andamos todos cansados. Para além disso, é mais uma forma de mostrar que hoje, em Angola há mais sorrisos...

    Um beijo,

    Alexandre Correia

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  10. Muito obrigado pelo blog e pelas lindas fotos!

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  11. Caro Zé,

    Eu é que agradeço ter "viajado" por aqui e espero que volte. Também já dei uma volta pelo seu blog e tem igualmente uma bela colecção de rostos angolanos.

    Kandando,

    Alexandre Correia

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  12. Caro Alex
    Viajar pelo seu blog transporta-me para terras Angolanas. Todos estes sorrisos estão gravados na minha memória, embora esboçados de outras faces e em tempos algo longinquos. Mas são os mesmos, rasgados e de tal modo sinceros que nem a objectiva os altera.
    Um dia, em terras do Quitexe, pedi a uma senhora que carregava o filho nas costas, autorização para tirar uma foto.
    Mostrou-se muito receptiva mas logo avisou: «Me desculpe mas não vou rir mesmo porque meu marido me bateu e estou muito triste!»
    E de facto não riu nem sorriu, deixando gravado na objectiva e na minha memória, uma sinceridade de expressão que transmitia o que lhe assaltava a alma! Uma genuinidade de sentimentos que por vezes nos confunde!
    Continuarei a e"espreitar" o seu blog e a deliciar-me cos as suas fotos e narrativas.
    Parabéns pelo seu trabalho.

    Casal

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  13. Olá Casal,

    Há quem tenha prazer em registrar a tristeza e somente fotografe as expressöes mais tristes, aquelas que näo escondem a dor que vai por dentro desse olhos até à alma. Eu näo gosto da tristeza e prefiro sempre procurar as expressöes mais alegres. E apenas registo as que säo genuínas. Também näo gosto daqueles sorrisos para a fotografia, que näo batem certo com o olhar triste de quem posa para a objectiva. Obrigado pelo cumprimento e continuem a viajar por aqui; väo encontrar sempre mais sorrisos.

    Abraco,

    Alexandre Correia

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